“Justiça e somente a justiça perseguirás” (Deuteronômio 16:20)
Tsedaká, diferentemente do que a maioria imagina, não significa caridade. Na realidade, a palavra Tsedaká deriva de Tsedek – justiça. No entanto, difere desta no seguinte aspecto: ela se esforça em apartar a lei do caminho da injustiça e em prevenir e remover as condições que dão causa à injustiça. Em outras palavras, a melhor definição seria “justiça social”; uma justiça que busca a eqüidade e equilíbrio entre todos.
Segundo a tradição judaica, o Criador fez ricos e pobres para que os homens fossem responsáveis uns pelos outros. Segundo esta visão, as posses de uma pessoa não são vistas como sua conquista pessoal, mas, antes de mais nada, como uma dádiva divina, para que seja cumprida uma determinada missão. O homem tem o poder de amenizar as diferenças existentes na sociedade através de seus recursos, sejam eles seu dinheiro ou seu empenho. Tal conceito é enfatizado sempre que recitamos o Bircat Hamazon – a benção após as refeições. No final da primeira brachá, encontramos a seguinte passagem: “Bendito sejas, ó Eterno, que provê alimento a todos”. Como podemos afirmar isso, uma vez que vemos milhões de pessoas que não têm nem ao menos um pedaço de pão para comer? Nossos sábios explicam que Deus realmente provê alimento a todos; o mundo é um enorme celeiro, armazenando sustento e conforto a todos os homens. Porém, cabe aos próprios homens administrarem a correta divisão deste alimento, tomando o necessário para si e doando o restante para seu semelhante. Fazendo isto, estamos elevando nossa existência física a um plano mais espiritual. Reconhecendo Deus como o verdadeiro proprietário, estabelecemos um elo inquebrantável de união entre os homens e entre estes e seu Criador.
Aron Barth (Valores Permanentes do Judaísmo, Ed. B’nai Brith 1965), traz uma importante colocação:
Até o dia de hoje, os que trabalham no serviço social, seja teórica ou praticamente, concordam que a cláusula de abrigo, alimento e roupa estão no fundamento de toda atividade social. Do mesmo modo nos é ordenado: “Porventura não é também que repartas o teu pão com o faminto e recolhas em casa os pobres desabrigados; e se vires o nu, cubra-o e não te escondas de teu semelhante?” (Isaías 58:7). Foi isto que deu lugar à rede ramificada de Tsedaká entre o povo judeu. Fundos para a distribuição de ajuda financeira e alimento, para a conservação de lares para os velhos, os órfãos, abrigos, casas de roupas – não são classificados como caridade, fazendo favores aos pobres, como entre outros povos, que dão caridade a todos. (...) O homem pobre não recebe Tsedaká por meio de um presente, mas por direito. O judeu é culpado de séria transgressão se ele se esquivar de dar ao pobre o que lhe é devido. Não temos o direito de viver em nossas casas, vestir e comer se não fizermos com que, dentro de nosso alcance, outros não sejam deixados sem casa, roupa e comida.
Portanto, Tsedaká é um dever judaico e não uma opção social, já que “até mesmo o pobre que vive da Tsedaká deve fazer Tsedaká” (Talmud Guitin 7b). Isto seria caridade e não Tsedaká! Vale lembrar que caritas, em latim, significa amor. Caridade, portanto, é o ato de dar aos que não têm aquilo que se tem – somente por bondade ou piedade. Tsedaká implica numa ligação muito mais pessoal entre doador e receptor, uma vez que tal relação se baseia em dever X direito. Tal é sua força dentro da literatura judaica, que Tsedaká está diretamente associada à vida humana, sendo capaz, inclusive, de reverter qualquer mau decreto, principalmente em Yom Kipur, conforme está escrito: “A Tsedaká salvará da morte” (Provérbios 10:2).
Tsedaká, na Torá, está freqüentemente associada a questões agrícolas, sendo que uma série de preceitos são determinados a fim de proporcionar aos pobres uma vida mais digna. Maimônides (1135-1204) vai além, afirmando (Leis dos Presentes aos Pobres 10,1):
Devemos ter um cuidado com a Mitzvá da Tsedaká muito maior que com qualquer outro preceito positivo; pois a Tsedaká estabelece o verdadeiro sinal na descendência do Patriarca Abrãao (...) e a única forma de Israel ser redimido é por meio da Tsedaká.
Ressalta ele, ainda, oito níveis na prática da Tsedaká, enumerados, a seguir, em ordem ascendente:
1) O mais baixo é dar, mas com relutância ou contra a vontade;
2) Dar alegremente, mas não proporcionalmente à necessidade do necessitado;
3) Dar proporcionalmente com alegria, mas após ter sido solicitado;
4) Dar alegremente e em proporção, sem ter sido solicitado, pondo, entretanto, a esmola na mão do pobre, envergonhando-o;
5) Dar de maneira tal que o necessitado receba a esmola e saiba quem é o seu benfeitor, sem ser-lhe conhecido;
6) Conhecer o beneficiário, sem que este saiba quem é seu benfeitor;
7) Quando nem benfeitor nem beneficiário conhecem-se mutuamente;
8) E o mais alto nível: antecipar a caridade, evitando a pobreza – ajudando o irmão empobrecido, seja com um presente, empréstimo, estabelecendo-o no comércio ou ensinado-lhe uma profissão, de modo que possa ganhar sua vida honestamente e não precise pedir aos outros.
Maimônides ensina duas grandes virtudes: a preocupação em não humilhar outrém e, ao mesmo tempo, o resgate da auto-estima pessoal. Neste contexto, abre-se um espectro de trabalho muito maior, o voluntariado, sobre o qual falaremos adiante no tópico Guemilut Chassidim. Com base nisso, afirmaram nossos mestres: “a Tsedaká equivale a todas as outras Mitzvót” ou “aquele que faz Tsedaká secretamente é maior que o próprio Moisés” (Talmud Baba Metzia 9).
Tsedaká, diferentemente do que a maioria imagina, não significa caridade. Na realidade, a palavra Tsedaká deriva de Tsedek – justiça. No entanto, difere desta no seguinte aspecto: ela se esforça em apartar a lei do caminho da injustiça e em prevenir e remover as condições que dão causa à injustiça. Em outras palavras, a melhor definição seria “justiça social”; uma justiça que busca a eqüidade e equilíbrio entre todos.
Segundo a tradição judaica, o Criador fez ricos e pobres para que os homens fossem responsáveis uns pelos outros. Segundo esta visão, as posses de uma pessoa não são vistas como sua conquista pessoal, mas, antes de mais nada, como uma dádiva divina, para que seja cumprida uma determinada missão. O homem tem o poder de amenizar as diferenças existentes na sociedade através de seus recursos, sejam eles seu dinheiro ou seu empenho. Tal conceito é enfatizado sempre que recitamos o Bircat Hamazon – a benção após as refeições. No final da primeira brachá, encontramos a seguinte passagem: “Bendito sejas, ó Eterno, que provê alimento a todos”. Como podemos afirmar isso, uma vez que vemos milhões de pessoas que não têm nem ao menos um pedaço de pão para comer? Nossos sábios explicam que Deus realmente provê alimento a todos; o mundo é um enorme celeiro, armazenando sustento e conforto a todos os homens. Porém, cabe aos próprios homens administrarem a correta divisão deste alimento, tomando o necessário para si e doando o restante para seu semelhante. Fazendo isto, estamos elevando nossa existência física a um plano mais espiritual. Reconhecendo Deus como o verdadeiro proprietário, estabelecemos um elo inquebrantável de união entre os homens e entre estes e seu Criador.
Aron Barth (Valores Permanentes do Judaísmo, Ed. B’nai Brith 1965), traz uma importante colocação:
Até o dia de hoje, os que trabalham no serviço social, seja teórica ou praticamente, concordam que a cláusula de abrigo, alimento e roupa estão no fundamento de toda atividade social. Do mesmo modo nos é ordenado: “Porventura não é também que repartas o teu pão com o faminto e recolhas em casa os pobres desabrigados; e se vires o nu, cubra-o e não te escondas de teu semelhante?” (Isaías 58:7). Foi isto que deu lugar à rede ramificada de Tsedaká entre o povo judeu. Fundos para a distribuição de ajuda financeira e alimento, para a conservação de lares para os velhos, os órfãos, abrigos, casas de roupas – não são classificados como caridade, fazendo favores aos pobres, como entre outros povos, que dão caridade a todos. (...) O homem pobre não recebe Tsedaká por meio de um presente, mas por direito. O judeu é culpado de séria transgressão se ele se esquivar de dar ao pobre o que lhe é devido. Não temos o direito de viver em nossas casas, vestir e comer se não fizermos com que, dentro de nosso alcance, outros não sejam deixados sem casa, roupa e comida.
Portanto, Tsedaká é um dever judaico e não uma opção social, já que “até mesmo o pobre que vive da Tsedaká deve fazer Tsedaká” (Talmud Guitin 7b). Isto seria caridade e não Tsedaká! Vale lembrar que caritas, em latim, significa amor. Caridade, portanto, é o ato de dar aos que não têm aquilo que se tem – somente por bondade ou piedade. Tsedaká implica numa ligação muito mais pessoal entre doador e receptor, uma vez que tal relação se baseia em dever X direito. Tal é sua força dentro da literatura judaica, que Tsedaká está diretamente associada à vida humana, sendo capaz, inclusive, de reverter qualquer mau decreto, principalmente em Yom Kipur, conforme está escrito: “A Tsedaká salvará da morte” (Provérbios 10:2).
Tsedaká, na Torá, está freqüentemente associada a questões agrícolas, sendo que uma série de preceitos são determinados a fim de proporcionar aos pobres uma vida mais digna. Maimônides (1135-1204) vai além, afirmando (Leis dos Presentes aos Pobres 10,1):
Devemos ter um cuidado com a Mitzvá da Tsedaká muito maior que com qualquer outro preceito positivo; pois a Tsedaká estabelece o verdadeiro sinal na descendência do Patriarca Abrãao (...) e a única forma de Israel ser redimido é por meio da Tsedaká.
Ressalta ele, ainda, oito níveis na prática da Tsedaká, enumerados, a seguir, em ordem ascendente:
1) O mais baixo é dar, mas com relutância ou contra a vontade;
2) Dar alegremente, mas não proporcionalmente à necessidade do necessitado;
3) Dar proporcionalmente com alegria, mas após ter sido solicitado;
4) Dar alegremente e em proporção, sem ter sido solicitado, pondo, entretanto, a esmola na mão do pobre, envergonhando-o;
5) Dar de maneira tal que o necessitado receba a esmola e saiba quem é o seu benfeitor, sem ser-lhe conhecido;
6) Conhecer o beneficiário, sem que este saiba quem é seu benfeitor;
7) Quando nem benfeitor nem beneficiário conhecem-se mutuamente;
8) E o mais alto nível: antecipar a caridade, evitando a pobreza – ajudando o irmão empobrecido, seja com um presente, empréstimo, estabelecendo-o no comércio ou ensinado-lhe uma profissão, de modo que possa ganhar sua vida honestamente e não precise pedir aos outros.
Maimônides ensina duas grandes virtudes: a preocupação em não humilhar outrém e, ao mesmo tempo, o resgate da auto-estima pessoal. Neste contexto, abre-se um espectro de trabalho muito maior, o voluntariado, sobre o qual falaremos adiante no tópico Guemilut Chassidim. Com base nisso, afirmaram nossos mestres: “a Tsedaká equivale a todas as outras Mitzvót” ou “aquele que faz Tsedaká secretamente é maior que o próprio Moisés” (Talmud Baba Metzia 9).
Prof. Sami Goldstein
Rabino da Comunidade Israelita do Paraná